- A origem geográfica da pandemia de gripe de 1918-1919 é desconhecida. Foi designada de gripe espanhola, gripe pneumónica, peste pneumónica ou, simplesmente, pneumónica. A designação "gripe espanhola" deu origem a algum debate na literatura médica da época, que talvez se deva ao fato de a Espanha, não participando na guerra, ter noticiado que civis em muitos lugares estavam adoecendo e morrendo em números alarmantes.
A doença foi observada pela primeira vez em Fort Riley, Kansas, Estados Unidos da América em 4 de Março de 1918,[1] e em Queens, Nova Iorque em 11 de Março do mesmo ano.Os primeiros casos conhecidos de gripe na Europa ocorreram em Abril de 1918 com tropas francesas, britânicas e americanas, estacionadas nos portos de embarque em França.
Em Maio, a doença atingiu a Grécia, Espanha e Portugal. Em Junho, a Dinamarca e a Noruega. Em Agosto, os Países Baixos e a Suécia. Todos os exércitos estacionados na Europa foram severamente afectados pela doença, calculando-se que cerca de 80% das mortes da armada dos EUA se deveram à gripe.A pandemia desenvolveu-se em três ondas epidémicas:
A primeira, mais benigna, termina em Agosto de 1918;
A segunda inicia-se no outono e termina entre os meses de Dezembro e Janeiro, tendo sido de extraordinária gravidade, afetando uma grande parte da população e com uma taxa de letalidade de 6 a 8%;
A terceira e derradeira, começa em Fevereiro de 1919 e termina em Maio do mesmo ano.
A pandemia, caracterizou-se mundialmente pela elevada morbilidade e mortalidade, especialmente nos sectores jovens da população e pela freqüência das complicações associadas. Calcula-se que afetou 50% da população mundial, tendo matado 20 a 40 milhões de pessoas, pelo que foi qualificada como o mais grave conflito epidémico de todos os tempos. A falta de estatísticas confiáveis, principalmente no Oriente (como China e Índia) pode ocultar um número ainda maior de vítimas.
É provável que o vírus responsável pela pandemia esteja relacionado com o vírus da gripe suína, isolado por Richard E. Shope em 1920.
Em Portugal, verificou-se uma elevadíssima taxa de mortalidade, com duas ondas epidémicas e uma ocorrência muito marcada entre os 20 e os 40 anos, que terá causado cerca de 120 000 mortos[2]. No Brasil foram registradas em torno de 300 mil mortes relacionadas à epidemia. A doença foi tão severa que vitimou até o Presidente da República, Rodrigues Alves, em 1919.
Por: Juliana Rocha
- Abrigados em trincheiras, os soldados enfrentavam, além de um inimigo sem rosto, chuvas, lama, piolhos e ratos. Eram vitimados por doenças como a tifo e a febre quintana, quando não caíam mortos por tiros e gases venenosos.
Parece bem ruim, não é mesmo? Era. Mas a situação naquela Europa transformada em campo de batalha da Primeira Grande Guerra Mundial pioraria ainda mais em 1918. Tropas inteiras griparam-se, mas as dores de cabeça, a febre e a falta de ar eram muito graves e, em poucos dias, o doente morria incapaz de respirar e com o pulmões cheios de líquido.
Em carta descoberta e publicada no British Medical Jornal quase 60 anos depois da pandemia de 1918-1919, um médico norte-americano diz que a doença começa como o tipo comum de gripe, mas os doentes “desenvolvem rapidamente o tipo mais viscoso de pneumonia jamais visto.
Duas horas após darem entrada [no hospital], têm manchas castanho-avermelhadas nas maçãs do rosto e algumas horas mais tarde pode-se começar a ver a cianose estendendo-se por toda a face a partir das orelhas, até que se torna difícil distinguir o homem negro do branco. A morte chega em poucas horas e acontece simplesmente como uma falta de ar, até que morrem sufocados. É horrível. Pode-se ficar olhando um, dois ou 20 homens morrerem, mas ver esses pobres-diabos sendo abatidos como moscas deixa qualquer um exasperado”.
No Brasil, a epidemia chegou ao final de setembro de 1918: marinheiros que prestaram serviço militar em Dakar, na costa atlântica da África, desembarcaram doentes no porto de Recife. Em pouco mais de duas semanas, surgiram casos de gripe em outras cidades do Nordeste, em São Paulo e no Rio de Janeiro, que era então a capital do país.
As autoridades brasileiras ouviram com descaso as notícias vindas de Portugal sobre os sofrimentos provocados pela pandemia de gripe na Europa. Acreditava-se que o oceano impediria a chegada do mal ao país. Mas, com tropas em trânsito por conta da guerra, essa aposta se revelou rapidamente um engano.
Tinha-se medo de sair à rua. Em São Paulo, especialmente, quem tinha condições deixou a cidade, refugiando-se no interior, onde a gripe não tinha aparecido. Diante do desconhecimento de medidas terapêuticas para evitar o contágio ou curar os doentes, as autoridades aconselhavam apenas que se evitasse as aglomerações.
Nos jornais multiplicavam-se receitas: cartas enviadas por leitores recomendavam pitadas de tabaco e queima de alfazema ou incenso para evitar o contágio e desinfetar o ar. Com o avanço da pandemia, sal de quinino, remédio usado no tratamento da malária e muito popular na época, passou a ser distribuído à população, mesmo sem qualquer comprovação científica de sua eficiência contra o vírus da gripe.
Imagine a avenida Rio Branco ou a avenida Paulista sem congestionamentos ou pessoas caminhando pelas calçadas. Pense nos jogos de futebol. Mas, ao invés de estádios cheios, imagine os jogadores exibindo suas habilidades em campo para arquibancadas vazias. Pois, durante a pandemia de 1918, as cidades ficaram exatamente assim: bancos, repartições públicas, teatros, bares e tantos outros estabelecimentos fecharam as portas ou por falta de funcionários ou por falta de clientes.
Pedro Nava, historiador que presenciou os acontecimentos no Rio de Janeiro em 1918, escreve que “aterrava a velocidade do contágio e o número de pessoas que estavam sendo acometidas. Nenhuma de nossas calamidades chegara aos pés da moléstia reinante: o terrível não era o número de casualidades - mas não haver quem fabricasse caixões, quem os levasse ao cemitério, quem abrisse covas e enterrasse os mortos. O espantoso já não era a quantidade de doentes, mas o fato de estarem quase todos doentes, a impossibilidade de ajudar, tratar, transportar comida, vender gêneros, aviar receitas, exercer, em suma, os misteres indispensáveis à vida coletiva”.
Durante a pandemia de 1918, Carlos Chagas assumiu a direção do Instituto Oswaldo Cruz, reestruturando sua organização administrativa e de pesquisa. A convite do então presidente da república, Venceslau Brás, Chagas liderou ainda a campanha para combater a gripe espanhola, implementando cinco hospitais emergenciais e 27 postos de atendimento à população em diferentes pontos do Rio de Janeiro.
Estima-se que entre outubro e dezembro de 1918, período oficialmente reconhecido como pandêmico, 65% da população adoeceu. Só no Rio de Janeiro, foram registradas 14.348 mortes. Em São Paulo, outras 2.000 pessoas morreram.
A EVOLUCAO DE UM VIRUS MORTAL
Ainda hoje restam dúvidas sobre onde surgiu e o que fez da gripe de 1918 uma doença tão terrível. Estudos realizados entre as décadas de 1970 e 1990 sugerem que uma nova cepa de vírus influenza surgiu em 1916 e que, por meio de mutações graduais e sucessivas, assumiu sua forma mortal em 1918.
Essa hipótese é corroborada por outro mistério da ciência: um surto de encefalite letárgica, espécie de doença do sono que foi inicialmente associada à gripe, surgido em 1916.
As estimativas do número de mortos em todo o mundo durante a pandemia de gripe em 1918-1919 variam entre 20 e 40 milhões. Para você ter uma ideia nem os combates da primeira ou da segunda Grande Guerra Mundial mataram tanto. Cerca de 9 milhões e 200 mil pessoas morreram nos campos de batalha da Primeira Grande Guerra (1914-1918). A Segunda Guerra Mundial (1939-1945) responde pela morte de 15 milhões de combatentes.
A gripe espanhola – como ficou conhecida devido ao grande número de mortos na Espanha – apareceu em duas ondas diferentes durante 1918. Na primeira, em fevereiro, embora bastante contagiosa, era uma doença branda não causando mais que três dias de febre e mal-estar. Já na segunda, em agosto, tornou-se mortal.
Enquanto a primeira onda de gripe atingiu especialmente os Estados Unidos e a Europa, a segunda devastou o mundo inteiro: também caíram doentes as populações da Índia, Sudeste Asiático, Japão, China e Américas Central e do Sul.
- Peste a bordo - Por isso, poucos deram atenção às pequenas notícias vindas da Europa sobre uma doença que já vitimara muitas pessoas. A epidemia se alastrou rapidamente pelos países em guerra, derrubando soldados de várias nacionalidades. A Missão Médica já estava em Dacar (Senegal) desde 5 de setembro, juntamente com outros navios do Brasil da divisão de guerra. Mais de 50 brasileiros, médicos inclusos, teriam morrido por causa da influenza. A reação foi de pavor quando o Demerara ancorou no Rio de Janeiro em 14 de setembro, depois de passar por Recife e Salvador trazendo mortos a bordo. A imprensa informava que outro navio, o Highland Glen, trazia jovens cujos pais morreram da doença em Portugal e que tinham como destino a cidade de São Paulo.
No dia 21 de outubro, São Paulo estremeceu: a espanhola fazia a primeira morte, um homem. Segundo Liane Bertucci, "a capital já havia começado efetivamente a parar". Fosse um filme, seria de tirar o fôlego. Repentinamente, as pessoas começam a tossir, suando febris, rostos azulando com a dificuldade respiratória. Os doentes que não são isolados correm desesperadamente para postos de socorro improvisados em escolas, clubes, igrejas, ou para as farmácias atrás de fórmulas que os tornem resistentes à peste - na forma pneumônica, é a morte. Autoridades distorcem e escamoteiam informações sobre a proporção da epidemia. Os médicos, atônitos com a letalidade da doença e a rapidez na propagação, desconhecem e divergem quanto a formas de tratamento.
A medicina popular ganha adeptos apaixonados, que discorrem sobre as propriedades do alho, cebola, canela, folhas de eucalipto e, sobretudo, do limão. O quinino vira produto cobiçado. Os jornais se enchem de anúncios de remédios que antes serviam apenas contra constipação e dor de dente, mas que pretendem revelar poder também contra a gripe espanhola. Um fabricante de cigarros anuncia: "Nada de pânico, fume Sudam!". Charlatões vendem suas alquimias, amuletos e feitiços.
O isolamento - Liane Bertucci escreve que "o tempo da epidemia é o da solidão, da suspeição generalizada, com o esgarçamento das relações humanas". Quem permanece imune tranca-se em casa, não recebe amigos nem parentes. Fecham-se bares, cinemas, teatros. Os guardas são aconselhados a evitar apertos de mãos, limitando-se à continência. Abraços e beijos são considerados quase que atos de traição. "As tragédias que aconteciam no delírio da febre se repetiam com freqüência", acrescenta a autora. Gente gripada tentava o suicídio ou matava o mais próximo. Doentes saltavam das janelas de suas casas ou dos hospitais.
Em poucos dias, 11.762 covas foram abertas e 8.040 utilizadas (não apenas de gripados). Os cemitérios do Araçá, Brás, Consolação e Penha ganharam iluminação noturna e o número de coveiros foi quadruplicado para dar conta da demanda. O próprio humor era mais negro, como na charge em que cocheiros disputam violentamente o cliente que quer transportar o caixão. O preconceito contra os pobres também aflorava: o bairro do Brás, por ser o mais populoso e habitado por operários, foi tido pelas autoridades e jornais como o mais sujeito à propagação do mal. "Agora, mais do que nunca, eles eram as classes perigosas", ironiza a historiadora.
O carnaval - A epidemia começou a declinar em fins de novembro. Enquanto os médicos prosseguiam nos debates sobre a causa e possíveis tratamentos da influenza, o número de hospitais provisórios foi diminuindo e os postos de socorro encerravam suas atividades. Suspendia-se a distribuição de alimentos e medicamentos. No dia 20 de dezembro, o jornal A Gazeta saudou em primeira página o fim da epidemia. Em janeiro pessoas ainda adoeceram na capital e, no interior, algumas morreram, mas quando fevereiro chegou a espanhola parecia ter ido embora definitivamente.
"O carnaval de 1919 foi extremamente alegre, explosivo. Além do fim da gripe espanhola, o país festejava o fim da Primeira Guerra com o armistício em novembro de 1918", lembra Liane Bertucci. Em plena quaresma, tosses e espirros voltaram a ser ouvidos em São Paulo. Foram detectados casos da moléstia aqui e em outros estados brasileiros, e todo o aparato para socorrer doentes começou a ser novamente armado. Entretanto, no Hospital de Isolamento, reaberto em 22 de março, apenas 11 leitos foram ocupados, como a historiadora registra em capítulo que intitulou de "ecos da gripe". A tragédia não se repetiu.
PARIS, França (AFP) - A gripe suína, que causou 20 casos de mortes confirmadas no México e dez casos de infeção confirmadas nos Estados Unidos, vem sendo motivo de muitas interrogações entre a população ante o alerta das autoridades sanitárias.
P. O que é a gripe suína?
R. Trata-se de uma doença respiratória que começa em criadores de porcos, um vírus gripal do tipo A que pode se propagar rapidamente.
P. É transmissível ao ser humano?
R. Sim, começando, em geral, por pessoas que estejam em contacto com esses animais.
P. Pode-se contrair a doença comendo carne de porco?
R. Não, como recordou neste sábado em Paris o Ministério da Agricultura. "A gripe de origem suína no México não se transmite pela carne, mas por via aérea, de pessoa para pessoa".
A temperatura de cozimento (71º Celsius) destrói os vírus e as bactérias, precisam os Centros de Controle de Enfermidades dos Estados Unidos (CDC).
P. Trata-se de um novo tipo de gripe suína?
R. Assim como no ser humano, os vírus da gripe sofrem mutação contínua no porco, um animal que possui, nas vias respiratórias, receptores sensíveis aos vírus da influenza suínos, humanos e aviários.
Os porcos tornam-se, então, "crisóis" que favorecem o aparecimento de novos vírus gripais, através de combinações genéticas, em caso de contaminações simultâneas.
Esses tipos de vírus híbridos podem provocar o aparecimento de um novo vírus da gripe, tão virulento como o da gripe aviária e tão transmissível como a gripe humana.
Esse tipo de vírus que o sistema imunológico humano desconhece poderia ter as características necessárias para desencadear uma pandemia de gripe.
p. Quais são os países afetados até o momento?
R. Exceto México e Estados Unidos, únicos países em que se registraram casos, as autoridades de Peru, Chile, El Salvador, Honduras, Colômbia, Nicarágua, Brasil e Costa Rica ativaram planos de vigilância sanitária.
No Canadá, a ministra da Saúde, Leona Aglukkaq, pediu à população para manter-se alerta.
P. Existe vacina contra esta doença?
R. Só para os porcos. Não para o ser humano. Segundo as autoridades mexicanas, que citam a Organização Mundial de Saúde (OMS), a vacina existente para humanos é para uma cepa anterior ao vírus, com o qual não é tão eficaz. Mas "a produção de vacina pode tornar-se possível na medida em que o vírus tenha sido identificado".
O Tamiflu, o medicamento que contéme oseltamivir, utilizado contra a gripe aviária, é eficaz diz a OMS.
A vacina contra a gripe estacionária humana não protege contra a gripe suína.
P. Por que a OMS está em estado de alerta?
R. "Porque há casos humanos associados a um vírus de gripe animal, mas também pela extensão geográfica dos diferentes focos, assim como pela idade não habitual dos grupos afetados", explicou a OMS em comunicado.